segunda-feira, 9 de novembro de 2009

MARTINISMO E A ORDEM KABALÍSTICA DA ROSA+CRUZ



Alguns meses após ter criado a Ordre Kabbalistique de la Rose-Croix, ou seja, mais de oitenta anos após a morte Saint-Martin, Papus e Chaboseau, ambos membros da direção da Ordem descobriram que tinham recebido uma filiação que descendia do célebre teósofo.

Papus afirmou ter sido iniciado em 1882 ao grau de S.I. « Superior Incógnito », por Henri Delaage que se declarava de um liame direto com Saint-Martin pelo sistema de « iniciações livres ». Quanto a Chaboseau, sua filiação teria sido transmitida por sua tia Amélie Boisse-Mortemart. Ambos decidiram se iniciar mutuamente e informaram imediatamente aos outros responsáveis da Ordem. Papus e Chaboseau conservaram esta filiação essencialmente espiritual de Louis-Claude de Saint-Martin à Ordre Kabbalistique de la Rose-Croix. Como declarou Delaage, era materializada então apenas por « duas letras e alguns pontos ».

Imediatamente consciente da riqueza desta herança, a Ordem deu corpo a esta transmissão associando-a à iniciação de « Filósofo Desconhecido » do sistema maçônico de H.-T. de Tschoudi. Em seguida, esta cerimônia de « Superior Incógnito » tornou-se o grau preliminar da Ordem. A versão maçônica, que era essencialmente simbólica, foi então ativada pelos conhecimentos operativos dos membros da Ordem. A Estrela Flamejante pôde então irradiar-se plenamente outra vez.

A partir deste momento, todo novo membro da Ordre Kabbalistique de la Rose-Croix devia primeiro ser recebido Superior Incógnito, Adepto de Saint-Martin.

Este primeiro grau de S\I\ constitui o fundamento moral e espiritual da Ordem. Ele é preliminar.

Como vimos no curso desta obra, Louis-Claude de Saint-Martin fundou uma "pequena escola em Paris", alguns anos após a morte do seu mestre Martinès de Pasqually. Esta sociedade (comunidade) tinha por objetivo a mais pura espiritualidade. Integrou as doutrinas de Martinès às suas e instaurou como um único grau, o de S\I\. Este título era uma retomada da denominação distintiva da dignidade suprema dos membros do Tribunal Soberano da Ordem dos Elus-Cohens. Na maior parte das sociedades secretas a iniciação fazia-se por graus. Aqui Saint-Martin optou por instaurar uma transmissão sobretudo moral e espiritual. Tratava-se de receber a chave que abre a porta interior da alma pela qual se comunicava com as esferas do Espírito. A esta altura, nenhuma condição, nenhum estado intermediário. A única condição é uma manifestação do desejo, um engajamento da alma e um despertar da vontade adequada.

Os princípios eram ao mesmo tempo idênticos e diferentes àqueles dos Elus-Cohens. As técnicas e as preparações ritualísticas, por exemplo, sempre foram relativamente simples na escola de Saint-Martin. Este último considerava que a preparação é o resultado da vida que se estabelece interior e exteriormente. Nesta via mística, ao contrário de certas etapas mágicas e teúrgicas, é no nosso trabalho interior diário, na nossa "atitude moral de pureza" que ocorre a preparação. Isso significa que todos os preparativos ritualísticos são inúteis para aquele que não pratica esta diligência interior. É a única condição para a abordagem de uma verdadeira pureza interior.

É por esta razão que a Ordre Kabbalistique de la Rose+Croix sempre considerou este grau como preliminar à formação moral empreendida. Portanto, nesse caso não era absolutamente necessário se fundar uma Ordem específica. Esta primeira etapa de S.I. é portanto fundamental, e paradoxalmente não necessita mais do que uma formação teórica mínima. Este estado é espiritual e constitui uma diligência interior indestrutível. É como imaginar que é necessário estudar a kabbala, a teologia ou qualquer outra ciência para se comprometer moralmente em tal busca interior. O intelectual não tem nada a ver com este tipo de tomada de consciência. A formação é de uma outra ordem, pois visa graus e etapas diferentes.

Eis o que foi a Ordem Martinista original. Foi necessário esperar Papus e os seus sucessores para que nascesse uma vontade de fazer do martinismo uma ordem estruturada em graus, conduzindo à única iniciação transmitida por Saint-Martin.

Alguns anos depois, em 1891, a Ordre Kabbalistique de la Rose-Croix pediu a Papus que desenvolvesse a iniciação de Superior Incógnito, sob a forma de uma Ordem externa cujo papel essencial seria a espiritualidade e a cavalaria cristã. Papus opta por estruturá-la de acordo com a gradação maçônica, em três graus. A única real iniciação foi evidentemente a última, a de S.I. (Superior Incógnito). Nenhuma ambigüidade na missão confiada a Papus. Tratava-se de permitir que um maior número de pessoas pudesse descobrir o pensamento de Saint-Martin e empreendesse uma busca moral representada na mais pura forma de cavalaria cristã.

Esta estrutura deu uma certa perenidade à Ordem Martinista, que continuou a se desenvolver após a morte de Papus e a ramificar-se segundo perante os riscos da sua história.

Por seu lado, a Ordre Kabbalistique de la Rose-Croix, fiel ao seu trabalho, continuou a aceitar em seu seio candidatos que já tivessem recebido a iniciação de Superior Incógnito, ou no caso contrário, a sua transmissão de acordo com a forma original como preâmbulo à diligência empreendida no seu seio.


Extrato da edição em espanhol do livro "O martinismo - os Servidores Incógnitos do Cristianismo" de J.L. de Biasi.